As crianças estão a brincar menos na rua, o que
facilita a obesidade e as impede de aprender a lidar com o risco, refere um
investigador, alertando que um pequeno arranhão agora pode ser uma grande
segurança no futuro.
As
brincadeiras dos mais novos têm mudado e atualmente não passam tanto pelas ruas
devido aos receios dos pais relativamente à segurança, mas também ao apelo das
novas tecnologias, mais adequadas ao espaço da casa. Esta alteração tem
consequências na preparação física das crianças, com a falta de movimento a
criar condições para o aumento do peso e para dificuldades em lidar com
situações de risco. Rui Matos, coordenador do Centro de Investigação em
Motricidade Humana do Instituto Politécnico de Leiria disse hoje à agência Lusa
que "as crianças estão menos na rua, o que tem a ver com os medos dos
pais, mas também com a realidade atual, com muito mais automóveis e risco de
atropelamento, e questões de segurança". Para o investigador e subdiretor
da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Instituto Politécnico de
Leiria, "resguardá-los do perigo é bom, o problema é que eles [os pais] os
resguardam de uma coisa mais simples que é o risco". E, se a criança
"não se mexeu muito, pode não haver risco ou perigo agora, mas vai haver
mais à frente, isto é, uma criança que não experimenta, que não arrisca um
pouquinho (...), mais tarde quando precisar na vida real de se libertar de
alguma situação eventualmente até perigosa, talvez não tenha as capacidades
motoras para o fazer, não tem equilíbrio, agilidade e para mim esse é o
verdadeiro risco", defendeu Rui Matos. "As pessoas, os pais, na sua
boa fé, querem que não se aleijem agora, mas um pequeno aleijão agora pode ser
uma grande segurança no futuro e esquecemos facilmente disso", salientou.
O coordenador do Centro de Investigação em Motricidade Humana falava à Lusa a
propósito do 1.º Seminário Brincar em Portugal, que vai decorrer em Leiria
sexta-feira e sábado, com o tema "A Psicologia e a Pedagogia por detrás do
brincar. O Instituto Politécnico de Leiria vai desenvolver um projeto para
incentivar os mais novos a irem a pé para as escolas, embora acompanhados por um
adulto, com o objetivo de "pô-los a andar, para prevenir a obesidade, mas
também para conhecer a cidade". "Nós, os investigadores, mostramos o
perigo que é não deixar as crianças arriscar. Deixá-las arriscar num ambiente
de relativa segurança é fundamental para se adaptarem às situações", disse
Rui Matos, acrescentando que "a criança tem de aprender a cair e a dominar
o seu corpo para cair o menos possível". O investigador recordou que,
quando os atuais adultos eram crianças, não tinham os brinquedos que existem
agora, usavam mais o corpo para a brincadeira, havia mais movimento. "O
que vemos atualmente em muitas brincadeiras, é as crianças, mais do que a
brincar com os brinquedos, a ver os brinquedos brincar, ou seja, temos muitos
brinquedos eletrónicos que brincam por si só, movem-se e deslocam-se, em vez de
ser alguém a empurrá-los ou a interagir mais diretamente com eles",
frisou. "Parece-me que as crianças são mais passivas, menos ativas, e isso
tem consequências, e já se está a notar aos mais variados níveis, como a
obesidade infantil", acrescentou.
in Diário de Notícias
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